Universidade de São Paulo, revelam fatos até então desconhecidos da família imperial brasileira e compõem um retrato jamais visto dos personagens históricos
Pela primeira vez em quase 180 anos foram exumados
para estudos os restos mortais de Dom Pedro I, o primeiro imperador brasileiro,
e de suas duas mulheres: as imperatrizes Dona Leopoldina e Dona Amélia. Os
exames, realizados em sigilo entre fevereiro e setembro de 2012 pela
historiadora e arqueóloga Valdirene do Carmo Ambiel, com o apoio da Faculdade
de Medicina da Universidade de São Paulo, revelam fatos até então desconhecidos
da família imperial brasileira e compõem um retrato jamais visto dos personagens
históricos, cujos corpos estão na cripta do Parque da Independência, na zona
sul da cidade, desde 1972.
A reportagem do jornal O Estado de S. Paulo acompanha os estudos de
Valdirene desde 2010, quando a historiadora e arqueóloga conseguiu autorização
dos descendentes da família imperial para exumar os restos mortais. Na
segunda-feira (18), ela apresentou sua dissertação de mestrado no Museu de
Arqueologia e Etnologia da USP.
Agora se sabe que o imperador tinha quatro costelas fraturadas do lado
esquerdo, o que praticamente inutilizou um de seus pulmões - fato que pode ter
agravado a tuberculose que o matou, aos 36 anos, em 1834. Os ferimentos
constatados foram resultado de dois acidentes a cavalo (queda e quebra de
carruagem), em 1823 e 1829, ambos no Rio.
No caixão de Dom Pedro, nova surpresa: não havia nenhuma comenda ou
insígnia brasileira entre as cinco medalhas encontradas. O primeiro imperador
do Brasil foi enterrado como general português, vestido com botas de cavalaria,
medalha que reproduzia a constituição de Portugal e galões com formato da coroa
do país ibérico. A única referência ao período em que governou o Brasil está na
tampa de chumbo de um de seus três caixões: a gravação Primeiro Imperador do
Brasil, ao lado de Rei de Portugal e Algarves.
Ao longo de três madrugadas, os restos mortais da família imperial foram
transportados da cripta imperial, no Parque da Independência, à Faculdade de
Medicina da USP, na Avenida Doutor Arnaldo, onde passaram por sessões de até
cinco horas de tomografias e ressonância magnética. Pela primeira vez, o maior
complexo hospitalar do País foi usado para pesquisar personagens históricos -
na prática, Dom Pedro I, Dona Leopoldina e Dona Amélia foram transformados em
ilustres pacientes, com fichas cadastrais, equipe médica e direito a bateria de
exames.
No caso da segunda mulher de Dom Pedro I, Dona Amélia de Leuchtenberg, a
descoberta mais surpreendente veio antes ainda de que fosse levada ao hospital:
ao abrir o caixão, a arqueóloga descobriu que a imperatriz está mumificada,
fato que até hoje era desconhecido em sua biografia. O corpo da imperatriz,
embora enegrecido, está preservado, inclusive cabelos, unhas e cílios. Entre as
mãos de pele intacta, ela segura um crucifixo de madeira e metal.
O estudo também desmente a versão histórica - já próxima da categoria de
"lenda" - de que a primeira mulher, Dona Leopoldina, teria caído ou
sido derrubada por Dom Pedro de uma escada no palácio da Quinta da Boa Vista,
então residência da família real. Segundo a versão, propalada por alguns
historiadores, ela teria fraturado o fêmur. Nas análises no Instituto de
Radiologia da USP, porém, não foi constatada nenhuma fratura nos ossos da
imperatriz.
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